A temida Gulf Stream (Fort Lauderdale – Nassau)

28/04/2015
Decidimos que partiríamos dos EUA para as Bahamas assim que a primeira janela de bom tempo aparecesse.  Além da temporada de furacão que começa em julho, e nós certamente não queremos estar por lá, nosso visto de permanência nos EUA também estava terminando. Precisávamos sair do país de qualquer forma.
Analisarmos detalhadamente a previsão do tempo, pois atravessaríamos a tão famosa e temida Gulf Stream. A Gulf Stream é a corrente que vem do Golfo do México subindo pela costa leste americana. É uma corrente bem profunda atingindo cerca de 2000 metros e sua velocidade pode atingir 6 nós. Quando o vento vem do Norte ele se encontra com a corrente que vem do Sul, formando ondas muito grandes.
Dois dias antes da partida, nosso “water maker” (dessalinizador de água) começou a vazar e no dia seguinte o gerador parou de funcionar. Apesar disto, resolvemos partir pois não tínhamos mais tempo. Daremos um jeito pelo caminho.
Decidimos que a previsão era muito boa para terça- feira dia 28. Terminamos as tarefas e organizações já na madrugada da terça (um dia eu ainda consigo dormir antes de uma grande travessia) e decidimos que partiríamos antes do amanhecer.
Mas havíamos esquecido um detalhe, fazer a imigração de saída dos EUA. O departamento marítimo de imigração abriria as 6:00. Acordamos as 6 e ligamos para saber qual seria o procedimento. Ninguém atendeu. Tentamos muitas vezes até as 8 da manhã, mas sem sucesso. Ligamos em um outro departamento que nos informou que não precisaríamos de nada, poderíamos partir.
Então às 8:00 largamos as amarras nos despendindo dos EUA que nos acolheu muito bem nesse tempo todo e seguimos para nossa primeira grande travessia em mar aberto rumo às águas claras das Bahamas.
Na saída o céu apresentava uma certa nebulosidade, nos protegendo do sol. Em pouco tempo já estávamos na “borda” da Gulf Stream com profundidade de uns 800 metros. É impressionante a cor da água nessa profundidade. É um azul escuro lindíssimo. Nos EUA eles chamam de Blue water, rsrsr porque será, né??!!
O primeiro terço da viagem foi tranquilo, a tão temida Gulf Stream estava calma, com ondulação de 0,2 a 0,3 metros, vento moderado. Motoramos por umas 2 horas e então abrimos as velas para um vento sudoeste.
Velejávamos lindamente quando por volta das 18 horas o céu começou a escurecer na nossa popa. As nuvens começaram a crescer, formando imensos cumulonimbus que se aproximavam rapidamente.
Na Gulf Stream a última coisa que queríamos era uma tempestade. O mar poderia crescer rapidamente formando ondas grandes.
Quando a tempestade nos alcançou estávamos no terço final da Gulf Stream, próximos da bancada das Bahamas.
O vento começou a aumentar, colocamos o primeiro rizo da nossa vela mestra (rizar uma vela significa abaixar um pouco da vela para diminuir o seu tamanho) e recolhemos um pouco de genoa. O vento continuava aumentando com rajadas de 35 nós. Decidimos colocar o segundo rizo e recolher um pouco mais de genoa. Apesar de estarmos no cockpit, fechados, achamos que seria mais prudente e seguro colocarmos os coletes e nos conectamos ao barco pelo “link” (cabo que de um lado se conecta no colete e de outro em algum lugar no barco). A visibilidade era mínima, e se não bastasse estarmos no meio da tempestade nosso AIS ( Automatic Identification System – equipamento que identifica e localiza embarcações, mostrando posição, velocidade, direção)  nos mostrava 5 navios próximos a nós. A tensão aumentou um pouco pois não conseguíamos vê-los no visual.  Em poucos minutos nos livramos destes gigantes do mar sem sequer termos visto um deles. “Santo” AIS. Foram cerca de 20 minutos de vento muito forte e céu negro. Nossa primeira tempestade no mar.
Como dizem, depois da tempestade vem a bonança. O céu na popa era magnífico com um lindo por do sol.
Deixamos a tão temida Gulf Stream para traz e entramos na bancada das Bahamas. A cor da água mudou drasticamente. De 2800 metros de profundidade fomos para 8 metros rapidamente. Apesar do céu ainda nublado a cor da água era um azul mais claro onde podíamos ver o fundo de areia plenamente.
Um terço do nosso percurso havia sido feito. A noite se aproximava e estávamos dentro da nossa programação.
Por volta das 2 horas da manhã os clarões dos raios mostravam que o céu estava encoberto. Eram raios que apenas iluminavam o céu, distantes. Foram cerca de duas horas de clarões constantes. Os raios começaram a ficar mais fortes e a chuva começou a cair. Os raios agora iluminavam o Oby. Olhei para o mastro para ver a direção do vento e mais de 200 pássaros nos sobrevoavam. Nunca havia visto nada parecido. Uma das laterais do bimini estava aberta e percebi que um passarinho entrou no cockpit. Como estava tudo escuro, achei que ele estivesse saído.
Os raios só aumentavam e caiam cada vez mais perto. Coloquei todos os eletrônicos que podia no forno (o forno é um bom isolante), fiquei no cockpit assistindo a magnífica e assustadora força da natureza. Os raios eram tantos e caiam tão perto do Oby, que quando o Daniel acordou do turno me aconselhou a sair do cockpit e ficar dentro do barco. Velejávamos tranquilamente, o vento era moderado e o barco estava estável. Mas os raios assustavam.
Por volta das 6 da manhã, após quatro intermináveis horas, como que num passe de mágicas os raios acabaram. Acho que meu pedido foi ouvido…
O dia começou a amanhecer, a chuva foi diminuindo e nós deixamos a bancada das Bahamas para trás. O segundo terço da viagem estava cumprido.
Para nossa surpresa, ao amanhecer, o passarinho ainda estava no cockpit. Ficou passeando pelo barco, um pouco assustado, mas ia do timão para o chart plotter como se fosse sua casa. Quase virou nosso bichinho de estimação rsrs, o skipper. Abri a lateral do bimini e ele voou em busca da sua liberdade.
Voltamos para águas profundas, agora tínhamos 800 metros abaixo da nossa quilha. O vento mudou para sudoeste com velocidade constante de 20 nós. Ajustarmos as velas e com vento de través voamos a 8 nós de velocidade com um mar liso até a entrada do canal de Nassau.
Subimos pela primeira vez nossa bandeira de quarentena. A bandeira de quarentena é uma bandeira amarela que devemos subir quando entramos em um país antes de fazermos a imigração. Fizemos a imigração, descemos a quarentena e subimos a bandeira de cortesia das Bahamas.
Agora sim, oficializados em território Bahamiano, arrumamos o barco e fomos ao nosso merecido descanso após essa travessia que nos trouxe muita experiência.

 Gulf Stream

Gulf Stream

 Capitão analisando a tempestade

Capitão analisando a tempestade

 Conectados ao cockpit

Conectados ao cockpit

 Navios no AIS

Navios no AIS

 Depois da tempestade a bonança

Depois da tempestade a bonança

 Skipper

Skipper

 Nassau na proa

Nassau na proa

 Farol de Nassau

Farol de Nassau

 Bandeira de quarentena

Bandeira de quarentena